quinta-feira, 15 de julho de 2010

PESCA EM ALTO-MAR – I: Ameaça à Biodiversidade Marinha


Quantas toneladas de peixes podemos extrair por ano dos mares? É possível aproveitar os nossos principais bancos de pesca de maneira sustentável?

O que há pouco tempo era inacessível, hoje está ao alcance das redes. Após esgotar os recursos das zonas costeiras, a indústria da pesca se voltou para o derradeiro eldorado que são os montes submarinos em alto-mar, abundantes em espécies raras e bem cotadas no mercado mundial.

Com motores mais potentes, redes maiores, sistemas de localização precisos e instrumentos eletrônicos sofisticados de navegação e detecção dos cardumes, as traineiras (navios pesqueiros) tornaram-se verdadeiras indústrias flutuantes e uma ameaça à biodiversidade marinha, pois conseguem vasculhar até 2 mil metros de profundidade – a foto abaixo é da cabine de comando da traineira norueguesa Harstad.

Com isso, as frotas financiadas pelos países ricos para procurar determinados peixes e crustáceos estão destruindo os últimos grandes reservatórios de biodiversidade marinha, um após o outro. Essa prática de exploração se parece mais com a utilizada por mineiros, que mudam de local à medida em que o minério se esgota, do que com uma gestão sustentável dos recursos vivos e frágeis. E, pra completar o quadro, as indústrias farmacêutica e de biotecnologia também estão interessadas nesses recursos.

Estima-se que 10 milhões de espécies vivam nas profundezas. Uma biodiversidade comparável à das grandes florestas tropicais. Seu nicho é justamente as zonas abissais, verdadeiras cadeias de montanhas submersas, com milhares e milhares de metros de altura, que se caracterizam pelo acentuado endemismo dos seres vivos e seu frágil equilíbrio biológico.

Todas as espécies de grande profundidade têm um ritmo de crescimento extremamente lento, a exemplo do olho-de-vidro laranja, ou peixe-relógio (Hoplostethus atlanticus). Conhecido pelo seu alto valor de mercado e presença garantida no cardápio dos melhores restaurantes das grandes capitais mundiais, esse peixe é uma das espécies de crescimento mais lento e com maior longevidade que conhecemos. Cada indivíduo demora cerca de 20 anos para chegar à idade adulta e pode viver até 150 anos. Durante a desova, esses peixes se concentram no topo das montanhas submarinas, tornando-se um alvo fácil para as traineiras. Esses fatores tornam esta espécie muito vulnerável à pressão da pesca (índice de vulnerabilidade de 73/100), o que tem levado ao progressivo esgotamento de muitas das suas populações - como mostra a primeira foto deste post.

Mas o olho-de-vidro laranja não é a única vítima da pesca predatória e destrutiva do seu hábitat. Os espinhéis (linhas de pesca com milhares de metros de comprimento e com uma infinidade de anzóis) matam várias aves marinhas e muitos peixes sem valor comercial, a pesca com dinamite e cianureto destrói os recifes de corais (hábitats de inúmeras espécies) e o arrasto das redes sobre as montanhas submarinas também mata corais ancestrais de crescimento lento, esponjas, estrelas-do-mar e outras espécies altamente vulneráveis, como tubarões, golfinhos, tartarugas, focas, leões marinhos, entre outras, que entram para as estatísticas da “pesca acidental” – foto abaixo.

Entre os anos 50 e 80, o volume global da pesca saltou de 17 milhões para 78 milhões de toneladas – índice que na última década começou a declinar e dar sinais de estresse em várias regiões, devido à diminuição drástica das populações de várias espécies. Além disso, espécies indesejadas (de baixo valor comercial) continuam sendo capturadas nas mesmas redes que pescam as que realmente interessam. Assim, estima-se que até 40 milhões de toneladas de peixes, quase todos mortos, são devolvidas anualmente aos oceanos.

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