segunda-feira, 4 de outubro de 2010

A BUSCA DE BRUCE – IV: O prazer e a ressaca moral.


Ual! – diz Sofia ao ver o mar escancarado da cobertura de Bruce.

Sofia corre para as janelas, quase tropeçando em uma das tábuas soltas do piso. A chuva dá uma trégua e a lua começa a aparecer entre as nuvens carregadas.

- Que vista maravilhosa! – diz ela observando que, além do mar, também é possível contemplar o rio Capibaribe, o Recife Antigo, Boa Viagem e Olinda.
- Eu ficaria horas aqui, apenas admirando.

Bruce aproveita para conferir suas pernas e traseiro, apreciando e aprovando ambos, enquanto apanha a garrafa do Merlot californiano que abrira antes de sair de casa – “se desperdiçar comida é inadmissível, desperdiçar vinho é um crime”, pensa ele.

Neste instante, Sofia se vira para ele, agradece a taça de vinho, olha em volta e pede licença para fazer um tour pelo ap. Bruce sorri e ela segue examinando os racks rolantes cheios de camisetas brancas, pretas e alguns ternos, as centenas de CDs, DVDs e livros dispostos pelo chão, a rede, o edredom jogado na cama, a sua prancha de Surf pendurada na parede e não muita coisa mais.

- Adorei esse lugar! Você se divorciou há pouco tempo ou coisa parecida? – pergunta ela.
- Não. Nunca me casei.
- Há quanto tempo você mora aqui?
- Uns cinco anos, mais ou menos.
- O que você faz?
- Sou Engenheiro Naval. Trabalho no estaleiro, em Suape.
- Poxa, isso dá uma grana!
- Não dá pra reclamar.
- Você tem namorada, ou alguém especial?
- Namorada, no sentido real da palavra, não.
- Ah, mas tem alguém especial?
- (...) Tenho. Mas, nada sério.
- Então você é do tipo que não quer nada sério. Deve ser por isso que sai sozinho num sábado à noite... – diz ela.
- Sozinho? Você está aqui, comigo.
- Onde é o banheiro? – pergunta Sofia, com um ar de riso pela resposta de Bruce.
- Final do corredor, à esquerda. Ou então no meu quarto.

Enquanto Sofia sai da sala, Bruce se dirige ao som. Após uma breve busca nos CDs, coloca o álbum “Reflections”, do Apocalyptica. Bruce tem o hábito de ouvir um bom Rock enquanto está na cama com uma mulher e procura um som que tenha a ver com a personalidade dela ou, como ocorre freqüentemente, com as suas primeiras impressões. No caso, acredita ele, Apocalyptica combina com Sofia.

Sofia volta do banheiro. Entra no quarto de Bruce, vestindo apenas a sua jaqueta e calcinha. Bruce pára um instante e aprecia o corpo de Sofia. Ambos se entregam a um beijo demorado e começam a fazer amor ali mesmo, no chão do quarto. Quando finalmente chegam à cama, por volta da sétima faixa do CD, os dois são vencidos pelo cansaço, e pelo álcool. Bruce ainda tem forças para uma chuveirada rápida antes de dormir.

Menos de uma hora depois, Bruce acorda com um som bem familiar, Sofia vomitando. Ele vai até o banheiro e a encontra sentada no chão, abraçada à privada. Bruce se agacha ao seu lado, segura a sua mão (bastante fria) e a conduz até o chuveiro, ela mal pode andar. Quando volta ao quarto com Sofia, percebe que ela vomitou no chão, ao lado da cama. O vômito em si não é problema para Bruce, ele já está acostumado a essa situação, que se repete freqüentemente. Então ele percebe, naquele exato momento, que essa freqüência é o grande problema.

“Putz! Eu to com trinta e cinco anos e continuo saindo com o mesmo tipo de garotas que saía quando tinha vinte.” – pensa ele. “To cansado de viver assim. Eu quero uma mulher de verdade, e não menina. Mas pra isso tenho que me comportar como homem, e não como um menino.” – fala para si mesmo.

Bruce, então, lembra de Hannah. Pensa em ligar para ela, mas desiste ao olhar o relógio. A última vez em que estiveram juntos foi há mais de duas semanas e o clima pesou entre eles, Hannah não gostou de vê-lo com Maya e disse que estava cansada daquilo tudo, embora Bruce sempre tenha deixado a situação bem clara.

“Será que a falta de Hannah desencadeou tudo isso?” – pensa ele.

Enquanto olha Sofia pegar no sono, é tomado por uma forte e inevitável ressaca moral. A sensação de vazio toma conta de Bruce de forma tão intensa que ele lembra de uma piada de palhaço, contada por um amigo numa mesa de bar há alguns anos:

“Um homem vai a uma Psicóloga e diz que, há algum tempo, a sua vida não tem mais sentido, tudo perdeu a cor, a graça. E pede à Psicóloga que o ajude de qualquer maneira. Ele está desesperado.
A Psicóloga começa dizendo que todo mundo tem problemas e que a vida não é assim tão ruim. E finaliza pedindo ao homem para fazer coisas simples e diferentes, como aproveitar a chegada do ‘Grand Circus’, que tem como principal atração o ‘Fabuloso Felippo’, o melhor Palhaço do mundo!
O homem, então, olha firme para a Psicóloga e diz, aos prantos: - Doutora... eu sou o Fabuloso Felippo...”

Quando ouviu essa piada pela primeira vez, Bruce sorriu como menino. Hoje, ela já não tem a menor graça.

Um comentário:

  1. A garota tava bebendo tequila e ele emenda com vinho?! Amador, amador... rs Só podia acabar desse jeito! Coitada dela, quando acordar vai tá morta de vergonha!

    PS: Fiquei imaginando o trânsito que Bruce pega todo dia pra ir pro trabalho!

    ResponderExcluir