quarta-feira, 20 de janeiro de 2010

CARNAVAL DE PERNAMBUCO (...) II – Maracatu Rural, a Festa dos Caboclos Guerreiros


O Maracatu Rural, ou Maracatu de Baque Solto, nasceu da fusão de vários folguedos populares de origem afro-indígena que existiam nos engenhos de cana-de-açúcar da Zona da Mata Norte do nosso Estado, principalmente em Nazaré da Mata, que nessa época era um dos mais importantes centros culturais e econômicos de Pernambuco.

No Século passado, na década de 50, o Maestro Guerra-Peixe deu a esse folguedo, também exclusivamente pernambucano, a nomenclatura oficial de Maracatu de Baque Solto e, na ocasião, declarou esta ser uma das mais belas representações da cultura brasileira. Vivendo basicamente do corte da cana-de-açúcar ou de subempregos, os brincantes do Maracatu Rural dão um verdadeiro exemplo de resistência quando, apesar de todas as dificuldades e total desamparo, conseguem manter viva a tradição. Esses homens fortes, ajudados por suas famílias, confeccionam suas próprias fantasias, onde cada um deles se doa, de corpo e alma, a esse brinquedo. A recompensa é a alegria de ser um brincante e emocionar os foliões durante o carnaval.

A musicalidade do Maracatu de Baque Solto vem da sua orquestra, formada por instrumentos de percussão e um naipe de sopros, com destaque para o trombone. O ritmo é a marcha, executada em quatro, seis e dez linhas rítmicas e com uma melodia bem característica. A principal figura do grupo é o Mestre, que puxa as toadas, ao mesmo tempo em que a orquestra silencia.

Além do Mestre, merecem destaque o Mateus, o Bastião, a Catirina, os Caboclos de Pena e os Caboclos de Lança, símbolo maior do Maracatu Rural. Fazendo evoluções com saltos e malabarismos, o Caboclo de Lança abre espaço no meio da multidão. Sua fantasia é composta de cabeleira de fios de papel celofane, onde predominam as cores vermelha e amarela, lenço colorido cobrindo a testa, calça e camisa de chitão, meiões e tênis, além da sua lança ricamente adornada com fitas de tecido de várias cores. O ponto alto da sua vestimenta é a gola, ricamente bordada em vidrilhos e lantejoulas, verdadeira obra de arte, da qual muito se orgulham os Caboclos de Lança. A gola é usada sobre o surrão, um tipo de mochila muito pesada que carrega guizos e chocalhos, produzindo um som forte e primitivo, dando um toque todo especial a esse personagem. Completando o seu visual exótico, o Caboclo de Lança traz o rosto pintado de urucum, óculos escuros espelhados (para devolver maus olhados), uma flor – um cravo – entre os dentes (para homenagear os companheiros que não estão mais nesse mundo) e a sua “arma de guerra”, a lança, uma vara de madeira ou um cano de alumínio medindo cerca de 2 metros e coberta de fitas de tecido colorido.

O Maracatu Rural sobrevive à custa do esforço e dedicação de seus brincantes. Alguns se destacam pela luta incessante em prol de condições mais dignas para o brinquedo, como fez durante toda a sua vida o saudoso Mestre Salustiano, fundador do Maracatu Piaba de Ouro, de Olinda. E para homenagear o Mestre Salu, vai um trecho de uma de suas toadas:

“Salu na rabeca é bom
Igual doce de caju...
Não tenho inveja de tu.
Quem quiser luxar que luxe,
Eu sou o tampa de Crush
Cantando Maracatu!
Maracatu vai,
Maracatu vem.
Maracatu foi criado
Nas senzalas de engém.”

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