sábado, 30 de janeiro de 2010

O Poder da Cultura


Quando voltava pra casa ontem à noite, ouvi o som do ensaio da Escola de Samba Deixa Falar, numa rua paralela à do meu prédio. Apesar de sermos vizinhos e de conhecer praticamente todos os integrantes da escola, eu nunca tinha ido ao ensaio. Então lembrei que o meu primo e sua esposa tocam na bateria da escola e fui conferir.

Logo que cheguei, o meu primo e os amigos fizeram a maior a maior festa e, como sabem que sou Músico, toco Maracatu e coordeno o Tambor de Luanda, trataram de me arrumar um instrumento. De cara, fui tocar surdo, o que não me agradou, pois eu gosto de liberdade (o surdo é responsável pela marcação do Samba). Aí fui pro tamborim e depois parti pra cima da cuíca. Pra encerrar a minha participação na Deixa Falar, o Patrono da escola pediu para que eu puxasse uma das minhas loas (toada de Maracatu) em ritmo de Samba. A escolhida foi a ‘Menininha’, e não é que o resultado ficou muito bom!

Foi uma experiência inesquecível, principalmente pelo que observei enquanto tocava: o poder da cultura popular de derrubar barreiras sociais e aproximar as pessoas. O bairro de Campo Grande, onde moro, assim como praticamente todos os outros da Região Metropolitana do Recife, é vizinho de uma favela e essa comunidade em peso faz parte da Escola de Samba, seja na bateria ou nas diversas alas. Integram a escola, também, pessoas de outros bairros que chegam ao ensaio com o seu Land Rover e outros carrões de fazer babar. Mas é só descerem das suas máquinas que tornam-se mais um no meio da bateria e obedecem às ordens do Mestre, que mora em um barraco e vai ao ensaio de bicicleta.

Eu toco Maracatu há mais de dez anos e nunca me interessei por Escola de Samba. Mas ontem pude constatar que esse tipo de agremiação trabalha valores como união, cooperação, disciplina e respeito de forma mais incisiva do que no Maracatu (afirmo isso com a experiência da dificuldade que tenho em controlar o ego dos viradores, que naturalmente se destacam mais do que os outros batuqueiros). Na Escola de Samba, se algum desses valores não for bem assimilado por qualquer dos integrantes, ela tem a sua harmonia comprometida. Daí o segredo da integração entre diferentes que tanto me chamou a atenção. Mesmo que só por duas horas, o tempo do ensaio, aquelas pessoas, de realidades tão distintas, me encheram de esperança em um dia ver uma sociedade mais justa e equilibrada, pois estavam interagindo de forma tão bela ao dividir o mesmo espaço, trocando experiências, olhares e sorrisos, (re)construindo algo que vale bem mais do que um 10 na passarela. A cultura popular, especialmente sob a forma da música, é um poderoso instrumento de educação e inclusão social. Eis o seu poder, a sua magia.

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